quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Carmélia.

Seus traços eram tão bem feitos, que pareciam ter sido moldados a mão por algum ser celestial. Movimentava-se sorrateira como um réptil. Uma cobra com passos lentos e certeiros, tão leves como passos de valsa. Seu olhar compenetrado encarava apenas um ponto na imensidão do nada, ponto este que não era eu. Seus lábios semicerrados impediam o veneno irreversível de escorrer entre os mesmos, contaminando o chão que parecia ter sido reconstruído com benitoíte só para ela passar. Carmélia, tão aprazível quanto a flor. Seu sorriso corruptível, seu andar avassalador. E por onde ela passa, muitos há de conquistar, com seu jeito tão sereno, com seu dom de arrepelar. Segurando o arcaico papel, manchado de lágrimas e com aroma de fel, eu suspiro descontente, observando sua letra tão iludente, com suas palavras alicientes. E as lágrimas não libertas, que tentaram descer inutilmente pelo meu rosto, são engolidas novamente, ferindo comovedoramente o meu coração. E eu te observo ir embora, tão majestosa, tão melindrosa, caminhando para o final da rua, deixando para trás seu aroma de bromélia. E no papel me resta suas palavras tão ilusórias:

"Para sempre sua,

Carmélia."

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