terça-feira, 2 de outubro de 2012

Bossa nova


Entre "trancos e barrancos", estava lá. A janela fechada, o leite derramado, a vidraça quebrada, o móvel empoeirado; o sorriso se perdera na imensidão do vazio de seus lábios. A doçura que antes predominava em seu olhar, era algo esquecido e, não mais, enaltecido. Quando desviava a visão, de modo cansativo até a parede, não havia mais o preto-e-branco que costumava confundir-lhe a mente, pelo contrário: Haviam pequenas manchas, pouco visíveis, espalhadas. De cor verde.
Seus lábios curvaram-se lentamente para cima, como há muito não faziam. Surpreendeu-se consigo mesma. "Estou sorrindo?", pensou, incólume. De forma súbita o vento abriu a janela, sem perdir-lhe licença, batendo a mesma contra a parede sem nem perguntá-la se estava bem. Entrara rapidamente, temeroso, como se estivesse atrasado. E com ele, uma melodia espalhou-se pelo quarto, tomando o ambiente e entrando aos poucos pelos poros da moça, adentrando sua circulação, difundindo-se pelo corpo e chegando até sua mente, fazendo-a cantarolar com o tom de voz firme e audível: "Apesar de você amanhã há de ser outro dia. Eu pergunto a você onde vai se esconder da enorme euforia?"
Rodopiava em cima das madeiras velhas e empoeiradas, como uma bailarina, em movimentos tênues. Ao longe, a cena era tão digna de ser detalhada em uma tela, quanto "O beijo" de Klint: A jovem, que antes desesperançada, dançava sobre os destroços com alegria, com a única certeza de que "Amanhã vai ser outro dia."

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